segunda-feira, abril 21, 2008

As lágrimas são netas do Mar

Vieram dizer ao Mar
que o sal
andava a portar-se mal.

Quem veio meter
minhocas na cabeça do velho Mar
foi a areia e a espuma.
Tudo porque o sal
era bonito
e não lhes ligava nenhuma.

De queixinha em queixinha,
disseram ao Mar
que o sal
tinha uma namoradinha.

Chamava-se Gota de Água.
Era linda,
branca, cristalina
e tinha vindo do céu azul.

As duas,
com dores de cotovelo,
contaram ao Mar
as conversas de amor
que tinham ouvido
quando o sal estava a namorar
muito entretido.

Então,
a areia disse que a gota de água
falou assim para o sal:

- Meu bem-amado,
se quiseres falar comigo
deixarás de ser salgado.

E a espuma disse que o sal
respondeu à gota de água:

- Minha ternura,
por ti deito o salgado fora
e fico numa doçura.

E neste disse-que-disse,
as duas marotas aproveitaram a maré
e
de tal maneira
atazanaram o velho,
que os seus cabelos ficaram em pé.

- O sal virar doçura? - pensou o Pai Mar.

E, ao pensar nisto,
deixou entrar a tristeza e a amargura
no seu imenso coração.

O Pai Mar nem queria acreditar.
Então,
ele,
pai,
criou o sal, desde catraio até homem feito,
feito para conservar
a beleza e a saúde dos habitantes do seu reino
-os peixes- e o rapaz queria tornar-se doçaria?
Não podia!!!

Chamou o filho e disse-lhe:

- Filho, tem paciência,
se continuas com o namoro,
considero desobediência.

O sal
fez ouvidos de mercador,
encolheu os ombros,
e continuou o seu grande amor...
pela gotinha de água.

Ao saber
o que o filho tinha decidido,
o Mar ficou bravo,
enraivecido.
Tornou-se turbilhão
e foi grande a aflição:
as ondas andaram numa fona,
os mexilhões levaram tapona,
a baleia veio respirar à tona,
um cavalo-marinho
tropeçou num penedo
e partiu o focinho.

Até uma gaivota,
de perna manca,
que era vizinha do Mar,
teve de dar à perna para não se afogar.

O velho Mar,
amargurado e furioso,
pôs o filho fora de casa,
em terra.

Mas o sal não se importou.
Casou.
Mas,
como não havia casas para alugar,
o sal e a gota de água
foram morar
para os olhos das pessoas.

É por isso que,
quando estamos tristes e amargurados
nos nossos corações,
choramos.
e as nossas lágrimas
são salgadas
porque são filhas do sal e da gota de água
e...netas do Mar.


JOSÉ VAZ
Esta poesia foi trabalhada com os alunos na biblioteca.

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